À medida que as semanas passam e novos detalhes são revelados no escândalo dos descontos ilegais de aposentados e pensionistas do INSS, vê-se um governo completamente perdido em todas as frentes: na contenção política dos estragos e, sobretudo, no caminho para indenizar quem foi roubado na mão grande naquilo que é seu direito mais básico e vital.
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Desde que o caso veio à tona, do presidente aos técnicos do órgão, todo mundo tenta apenas ganhar tempo, sem entender que, para quem vai olhar o contracheque e descobre que há meses ou anos vem havendo desconto de seus vencimentos sem ter autorizado, o que bate é desespero.
Ninguém faz a mais pálida ideia de quando e como o dinheiro será devolvido, a quantos e a quanto monta, de verdade, o prejuízo. Hipóteses lançadas a granel, de um jeito meio displicente, por autoridades que deveriam entender ser de fato urgente uma solução para algo tão grave , só evidenciam que ainda se sabe muito pouco dos mecanismos, da dimensão e dos responsáveis pelo esquema que, desde 2019, lesou pelo menos 6 milhões de beneficiários da Previdência. É tanto chute que o valor do prejuízo já foi estimado em R$ 6,3 bilhões, mas agora foi calculado em R$ 5,2 bilhões, um “desconto” que ninguém explica com a transparência exigida de onde veio.
Cada um que fala a respeito do assunto produz um rosário de desculpas esfarrapadas e promessas inexequíveis. O novo presidente do INSS, Gilberto Waller Junior, deu entrevistas em que foi jogando balões de ensaio para cima para ver se algum parava no ar: o dinheiro poderia vir de bens apreendidos pela Polícia Federal (equivaleria a tentar conter uma enchente com um copinho de café) ou das próprias associações que operaram o esquema (caminho final, mas que exige um demorado processo judicial).
Quando instado a falar da saída mais provável e rápida — o Tesouro ser chamado a realizar o ressarcimento, a Fazenda mandar um projeto ao Congresso remanejando recursos do Orçamento para esse fim e, depois, o governo dar um jeito de buscar reaver o prejuízo junto a quem lesou os segurados —, foi propositalmente vago.
A reunião posterior, em que nada menos que sete ministérios foram chamados para tentar descascar o abacaxi e acabou com a fruta ainda com casca e coroa, é a prova cabal de que não se sabe o que fazer. Será um escárnio e um prato cheio para a oposição deixar esse disco rodando sem tocar nada até a volta de Lula de mais uma viagem internacional.
Quem percebe que seu parco e suado dinheiro vinha sendo surrupiado na surdina, com no mínimo a incúria do governo para detectar a fraude, tem pressa. Pressa e revolta, que se espraia num desgaste para o presidente que a bateção de cabeça geral deixa claro ninguém ter compreendido ainda em sua extensão.

Tanto é que a oposição vai esticando a agonia do governo, cozinhando o galo, coletando assinaturas para uma CPI Mista, enquanto vai colecionando fatos novos para abastecer o arsenal que será deflagrado contra Lula. Nesse caso, pouco importa que o roubo de fato tenha começado no governo Jair Bolsonaro. C
rise envolvendo aposentados, sindicatos e outras entidades classistas é o tipo de escândalo que fere de morte a esquerda, partidos como PT e PDT e a base social e política de Lula e de muitos de seus ministros. Para Bolsonaro, não chega a fazer cócegas, ainda mais porque ele está mais preocupado com o julgamento dos atos golpistas, que pode colocá-lo na cadeia — e está adorando que esse escândalo o tenha tirado um pouco do foco.
É generalizado o revés para Lula, e ele ter reunido sete ministérios e ainda assim sair sem ao menos um esboço de satisfação a dar a quem está em desespero é um atestado de incompetência e debilidade política, tudo que tem feito sua popularidade escorrer pelos dedos, sem sinal de recuperação no horizonte.