Bom dia, boa tarde, boa noite, a depender da hora em que você abriu esse e-mail. Sou o editor de Política e Brasil do GLOBO e nessa newsletter você encontra análises, bastidores e conteúdos relevantes do noticiário político.
Guilherme Boulos tem um acordo com Lula e será ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência assim que Edinho Silva assumir o comando do PT e abrir espaço para Márcio Macêdo ocupar alguma função no partido. Enquanto a vaga no Palácio do Planalto não vem, o deputado do PSOL investe em uma aproximação com os entregadores de aplicativos, público que o governo tenta se aproximar desde o início do mandato, mas não faz ideia como.
A estratégia do psolista tem dois pilares: pela via tradicional, apresentou em maio um projeto de lei, o 2479, que estabelece remuneração mínima de R$ 10 por entregas feitas para cada profissional. Pela via nada convencional, apelou para uma espécie de guerra cultural contra o iFood, a gigante do setor de delivery.
Com 6 minutos e 3 segundos, um vídeo de Boulos chamado “O que você não sabe sobre o iFood – Não dá tempo de explicar no TikTok” tem circulado em grupos de Whatsapp. Quase um ano depois de uma campanha para prefeito de São Paulo em que buscou se apresentar mais moderado, é a sua volta às raízes de um discurso mais à esquerda.
Na primeira metade da gravação, Boulos investe na disputa de classes. Lembra a receita de R$ 7 bilhões do iFood declarado em 2023, ressalta o banco digital criado para restaurantes no ano seguinte com faturamento de R$ 600 milhões e faz o contraponto com o aumento de R$ 1 para os entregadores após a paralisação deste ano. “Essa é a realidade hoje. Uma empresa com receitas que crescem com ritmo acelerado de um lado, e de outro lado o crescimento da exploração aos trabalhadores”, diz o deputado.
Na segunda metade do vídeo, Boulos apela a um discurso nacionalista. O parlamentar contesta a propaganda do iFood, que se coloca como uma empresa brasileira em seu site. Ele destaca a venda, feita em 2022, do controle da companhia para o grupo holandês de tecnologia Prosus por R$ 9,4 bilhões. A partir daí, começa o uso de técnicas narrativas que muito se assemelham aos métodos de distorção que a esquerda tanto critica na direita.
Boulos explica que 54% das ações da Prosus são da Nasper, um conglomerado de mídia fundado em 1915 pelos africâners, um grupo étnico sul-africano. O vídeo sobre a empresa de delivery brasileira passa, então, a exibir a foto de Daniel Malan, um dos editores de jornais do grupo Nasper no passado, que participou da redação de leis que embasaram o apartheid. Os dados apresentados pelo futuro ministro de Lula são suficientes para Boulos fazer as seguintes conclusões:
“O iFood apesar de ter sido criado aqui não é mais controlado pelos brasileiros. Sequer pelos holandeses. É por esse mega grupo sul-africano que tem relações históricas com o apartheid”, conclui o deputado, que ainda arrumou uma forma de colocar outro personagem inimigo número um da esquerda no enredo montado para a internet: “Os africâners investiram depois as fortunas que acumularam às custas do sofrimento do povo negro em várias iniciativas econômicas. Uma delas é a Nasper. Mas outra bem conhecida é o grupo do Elon Musk. O pai dele, um africâner, era o dono de uma grande mineradora na África do Sul durante o apartheid”. A newsletter procurou o Ifood e o deputado para se manifestarem. A empresa não quis falar, e o deputado reafirmou todas as frases ditas no vídeo.
Os trabalhadores de aplicativos seguem como alvo do governo mesmo depois do fracasso da proposta feita em 2024 que previa contribuição do segmento para o INSS. Atualmente, a estratégia do Planalto tem mirado mais as operações de financiamento. Tramita no Congresso Nacional uma MP que amplia a modalidade de crédito consignado para os motoristas de aplicativo e mototaxistas. Além disso, o Planalto estuda a edição de outra MP que cria uma linha de crédito no BNDES para financiar a renovação da frota do segmento.
Tanta mobilização governamental explica-se pelos números de pesquisas. Datafolha da semana passada apontou que 59% dos brasileiros preferem trabalhar por conta própria a ter um emprego formal, exatamente a realidade da categoria que o Planalto tenta seduzir. No “Valor Econômico” de segunda-feira, artigo de Sofia Esteves, fundadora da Cia de Talentos, Bettha.com e Instituto Ser+, tentou responder a pergunta que está na cabeça de Lula, seus ministros e toda a esquerda: “Por que CLT virou sinônimo de vida corrida e fracassada?”. Sofia convida os leitores a ver vídeos nas redes sociais de crianças e adolescentes sobre a carteira de trabalho. “O discurso vem acompanhado de menções a jornadas longas, deslocamentos cansativos e remuneração desproporcional ao esforço”. A psicóloga conclui seu raciocínio com mais uma hipótese: “Também me chama a atenção quem diz não querer ter uma vida como a de seu pai e da sua mãe. São jovens que cresceram presenciando o cansaço, o estresse, e, muitas vezes, a frustração de adultos que abriram mão de qualidade de vida para manter um emprego formal”.
Roberto Medina faz proposta para Paes por outro evento na praia no mesmo estilo das apresentações de Madonna e Lady Gaga em Copacabana
O empresário Roberto Medina sugeriu a Eduardo Paes um show nos mesmos moldes do realizado nas areias de Copacabana nos últimos dois anos. O fundador do Rock in Rio quer fazer o evento na praia de Botafogo com a maravilhosa vista do Pão de Açúcar ao fundo.
Pelas mãos de Luiz Oscar Niemeyer, outro importante empresário do entretenimento, o palco em frente ao hotel Copacabana Palace recebeu Madonna e Lady Gaga em 2024 e 2025.
No fim de abril, Paes postou nas redes que sonha em trazer o U2 para tocar no Rio em 2026. Na cabeça da equipe da prefeitura, há outras opções de nomes para investir nos próximos anos para shows na praia como Beyoncé, Adele e Coldplay. A colombiana Shakira chegou a ser oferecida para cantar na praia, mas as negociações não avançaram.
Ontem, no Rio, Roberto Medina celebrou o avanço de um projeto que viabiliza um importante projeto para os seus negócios. A Câmara de Vereadores aprovou a lei que cria o mecanismo para financiar as obras do futuro Parque Imagine, que será construído na área do Parque Olímpico, na Zona Oeste do Rio. O projeto, apresentado em setembro do ano passado, é capitaneado pela Rock World, empresa que gerencia o Rock in Rio, e prevê um parque de eventos que contará com capacidade para 100 mil pessoas por dia e 385 mil metros quadrados para receber shows, eventos esportivos, culturais e corporativos. A lei prevê que um total de um milhão de metros quadrados que hoje seriam autorizados para construções no terreno do Parque possam ser negociados para aplicação em outras áreas da cidade, gerando recursos para a obra.
Se por um lado, os shows na praia trazem dividendos políticos para Paes, por outro alimentam ainda mais a guerra cultural. Os shows de Madonna e Lady Gaga viraram alvos de crítica de bolsonaristas pelo dinheiro público gasto com as atrações. A organização da apresentação de Lady Gaga custou R$ 92 milhões, informou o colunista Ancelmo Gois.
O filme sobre a histórica reportagem do colega Fábio Gusmão com a senhora que filmou o tráfico de drogas em uma favela do Rio nos anos 2000 com uma câmera VHS faz refletir sobre jornalismo e segurança pública.
Fernanda Montenegro está espetacular no papel de dona Nina. Vale muito a cena em que ela reage diante da inspetora interpretada por Laila Garin ao saber que teria que mudar de nome e cidade caso formalizasse a sua denúncia na polícia. “Não sou bandida. A senhora quer que eu morra para não morrer?”, diz, irritada com as condições impostas pelo Programa de Proteção à Testemunha. Depois, ela acaba sendo obrigada a aceitar e vira a célebre Dona Vitória.
O filme mostra que é possível, sim, unir a fome por furo jornalístico e responsabilidade social. Gusmão teve acesso aos vídeos, poderia ter se dedicado única e exclusivamente em publica-los, mas a sobrevivência da dona Nina também foi tratada como sua prioridade desde o início da apuração. Mais que repórteres, somos humanos.
O resultado do trabalho jornalístico aparece no fim do filme: Depois da publicação da matéria no jornal Extra, “27 criminosos foram presos e condenados, sendo 9 policiais”.