O saneamento básico deve atrair R$ 70 bilhões em investimentos com a nova rodada de 26 leilões prevista para este ano, abrangendo principalmente as regiões Norte e Nordeste, áreas historicamente carentes de acesso à água tratada e rede de esgoto. Segundo a Associação Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), 26,3 milhões de pessoas devem ser beneficiadas em 849 cidades.
- Dificuldades à frente: Clima traz desafio ao saneamento
- Compromissos climáticos: Setor privado se prepara para a COP30
O primeiro grande leilão será no Pará, em 11 de abril. Trata-se de um dos nove projetos estruturados pelo BNDES, que prevê rodadas em Pernambuco, Paraíba e Rondônia e Minas Gerais. Para 2026, estão na fila Rio Grande do Norte, Maranhão e Goiás.
Embora o cenário seja desafiador em razão do aumento dos juros — a Taxa Selic está em 14,25% ao ano, e há previsão de nova alta em maio — e da inclusão de áreas mais carentes, empresas do setor e especialistas estão otimistas.
— Há grandes projetos estaduais de saneamento para este ano, como no Pará, em Pernambuco e Rondônia. Há ainda a possibilidade de fazer um leilão na Paraíba e em Goiás em esgoto. É fase importante do modelo, que está migrando mais para o Norte, Nordeste e Centro-Oeste. São áreas com déficit e risco maior, mas com potencial maior de ganho, com redução de inadimplência e de perda de água. Embora os juros estejam elevados, os projetos são de 30 anos — disse Nelson Barbosa, diretor de Planejamento e Relações Institucionais do BNDES.
Barbosa explica que os vencedores do certame devem buscar crédito a partir do segundo semestre, quando ele avalia que o cenário macroeconômico será mais favorável:
— Temos interessados nos leilões, como o do Pará. Já estamos fazendo roadshow com os principais investidores. Vai ter alguma disputa, talvez não tão grande quanto em alguns mercados consolidados do Sul e Sudeste. Recomendamos colocar em licitação quando vemos interesse no mercado.
Segundo Luana Pretto, presidente-executiva do Instituto Trata Brasil, os leilões estão cercados de desafios. Para ela, é preciso avaliar como ficará a gestão do saneamento em áreas rurais e vulneráveis para que os processos sejam rentáveis. Ela lembra que 32 milhões de pessoas não têm acesso à água tratada. Luana destaca que, na Região Nordeste, 76% da população tem acesso à água potável, percentual que cai a 64% na Região Norte. E há 90 milhões de brasileiros sem acesso à coleta de esgoto.
- Ações sustentáveis: Economizar água se tornou vital para as empresas
— As estruturações precisam levar em conta a questão da mitigação e adaptação às mudanças climáticas. A universalização precisa vir acompanhada de ações para que o sistema funcione. Há ainda a regulação pulverizada. A Agência Nacional de Águas e Saneamento é responsável por editar as normas, mas temos mais de cem agências que, muitas vezes, não têm governança estruturada e equipe técnica para acompanhar os indicadores de eficiência e expansão dos serviços — diz.
Além da questão rural, Luiz Gronau, sócio-diretor da A&M Infra, lembra que o sucesso dos leilões vai depender da modelagem, das premissas assumidas e dos investimentos para a universalização. Para ele, o leilão de Pernambuco pode ter maior demanda.
— Nos outros estados, vai depender do tamanho do investimento, da complexidade técnica e do formato, como concessão parcial, plena ou PPP (Parceria Público-Privada). Tudo isso influencia.
- Censo: saneamento avança, mas um quarto da população ainda não tem acesso
Daniel Engel, sócio da área de Infraestrutura & Projetos do Veirano Advogados, avalia que, embora o cenário macroeconômico não seja o melhor, poderá haver competição.
— Os ativos a serem leiloados são de qualidade. O Brasil tem tido capacidade de ofertar bons projetos. Nossa expectativa é que players já consolidados seguirão atentos e apresentarão propostas. Novos entrantes permanecem buscando oportunidades — diz.
- Na torneira: Pará, Amapá e Rondônia ainda têm menos da metade da população com água encanada
Rogério Tavares, vice-presidente de Relações Institucionais da Aegea, diz que a empresa, que atua em 15 estados, monitora oportunidades, avaliando diferentes formatos:
— Contamos com parceiros em diversas frentes de negócios que, juntos, analisam cada projeto, mantendo o foco na disciplina financeira e no retorno aos acionistas. Com atuação em todas as regiões, a Aegea mantém modelo operacional eficiente e estrutura de capital robusta, o que lhe permite avaliar projetos e apresentar propostas.
Barbosa, do BNDES, aposta em consórcios com empresas que já levaram concessões nas regiões Sul e Sudeste. Ele lembra que o banco financia 80% dos projetos. Desde 2018, o BNDES desembolsou R$ 17 bilhões e tem aprovado outros R$ 36,7 bilhões em projetos:
— Como as empresas estão com a carteira elevada, devem formar consórcios com fundos de investimento. Esperamos participação maior de fundos estrangeiros.
André de Angelo, diretor País da Acciona Brasil, que selou uma PPP no Paraná ano passado, tem planos de ampliar a atuação no Brasil:
- Leia também: Ameaças do clima obrigam concessionárias de saneamento a adaptar operações
— A empresa tem interesse em expandir a atuação no setor, avaliando oportunidades em Minas Gerais, Pernambuco, Goiás, Região Sul e em leilões de concessões de diversos municípios dessas regiões, além da possibilidade de aquisição de ativos estratégicos.
Segundo Leonardo Righetto, presidente da Rio+Saneamento, que atua em 18 municípios, incluindo 24 bairros da capital, os investimentos já passaram de R$ 460 milhões. Para 2025, diz, a previsão é que sejam investidos R$ 320 milhões.
— Desde o início das operações, em agosto de 2022, investimos em estações de tratamento de água e esgoto, revitalização de reservatórios e construção de adutoras e 270 km de redes de água e esgoto.