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‘Ópera pode ser divertida, mas não é entretenimento’, diz diretor da Ópera Nacional de Paris

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outubro 11, 2025
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Solistas da Academia da Opera de Paris no Theatro Municipal de São Paulo — Foto: Renato Mangolin/Divulgação

Poucos cariocas com interesse em ópera e balé ignoram que o Theatro Municipal do Rio é um edifício inspirado no Palais Garnier, de 1875, um dos dois teatros da Ópera Nacional de Paris – o outro é o moderníssimo Opéra Bastille. Portanto, quando o principal diretor da instituição cultural francesa (fundada por Luís XIV, em 1667) visita o Rio, pode-se medir os rumos diferentes que saem de um mesmo ponto de convergência.

No Brasil para o concerto dos alunos da Academia do Opéra (neste sábado, no Municipal, às 19h), o alemão Alexander Neef, 51, conversou com O GLOBO sobre os desafios dos gêneros que produz em Paris há seis anos, numa carreira que passou por Canadá e Estados Unidos. O concerto esteve em São Paulo e Curitiba, faz parte das comemorações do Ano França-Brasil e trouxe gente promissora, como o tenor noruego-americano Bergsvein Toverud e a soprano brasileira Lorena Pires Adão, aluna da academia, em interpretações de Bizet e Gounod. Os ingressos custam de R$ 15 a R$ 60. Os nove solistas serão acompanhados pela Orquestra do Theatro Municipal, regida por Felipe Prazeres.

A Academia da Opéra de Paris exibiu em São Paulo um ótimo nível de seus alunos. Como vê o futuro das artes produzidas pela instituição?

O que mais me impressiona é que sempre há jovens que ainda querem seguir nessa carreira em que, no começo, não há qualquer garantia de que conseguirão. Apenas 1% dos que tentam realmente conseguem. Para instrumentistas e bailarinos, se a carreira não for iniciada aos 5 ou 6 anos, simplesmente não é possível. No caso dos cantores, só se pode treinar a voz na idade adulta. Precisam decidir a partir dos 16 a 18 anos se querem ser cantores e começar a treinar. Se não fossem esses jovens artistas, seria o fim de tudo.

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O avanço da Inteligência Artificial sempre é um tema suscitado quando falamos de carreiras e oportunidades para jovens. Na ópera, esse tema o preocupa?

Torço para que não cometamos com a IA o mesmo erro que cometemos com a rede social, que era algo que pensávamos, “ah, isso é divertido”. E agora percebemos que é muito mais que diversão. E uma vez que isso se abre, é como uma caixa de Pandora que fará parte do futuro e que será muito difícil de fechar. Espero que haja uma consciência a fim de que seja uma ferramenta, em vez de sermos nós os seus servos.

São dois mundos que se aproximam cada vez mais, o do espetáculo presencial e o do espaço digital. Como esses desafios são encarados no Opéra, que também é hoje uma grande plataforma de gravações e transmissões?

A pandemia foi um momento muito sério para o nosso setor que nos fez pensar em como existir quando não há ninguém lá. E na verdade, o que acontece no teatro, seja dança, ópera ou música clássica, o que for, não mudou tanto assim nos últimos, digamos, dois séculos. Acho que, por muito tempo, nossas formas de arte pareceram um pouco inseguras e até se sentiam culpadas por isso — por não estarem “evoluindo” tanto quanto outras áreas. Mas acredito que precisamos transformar isso em uma vantagem e afirmar: o que acontece aqui é o coração da nossa atividade — é isso que somos e o que fazemos.

Solistas da Academia da Opera de Paris no Theatro Municipal de São Paulo — Foto: Renato Mangolin/Divulgação

E do ponto de vista econômico?

Também, já que nosso modelo financeiro depende fortemente da lotação total dos teatros. Temos sorte, em Paris, de que os teatros estão sempre cheios. Mas é algo pelo qual precisamos trabalhar todos os dias, porque não é garantido. Há bastante renovação na plateia — chegamos a ter até 40% de público novo em cada apresentação, ou seja, pessoas que compram ingresso pela primeira vez em seu próprio nome. E como a maioria compra o ingresso hoje online, é possível ter o e-mail, fazer um acompanhamento, e ver como transformá-las em um público mais fiel, que volta mais vezes. Conseguimos acompanhar esse processo — e temos a sorte de manter os teatros entre 93% e 95% de ocupação durante toda a temporada. Mas, além disso, somos uma instituição pública, com uma missão de serviço público: levar a ópera a regiões do país e do mundo, a públicos que não nos ajudam a gerar receita. Então, quando começamos a desenvolver nossa presença online com a plataforma de streaming, ela não foi pensada como uma nova fonte de lucro — e sim como um braço estendido, para alcançar novas pessoas. Isso foi deliberado assim. É uma experiência que, se você realmente quiser viver, precisa vir até nós. E acho que isso não é diferente do que acontece com uma pintura em um museu — uma obra de arte tem uma aura, uma presença física. Você pode tirar uma foto, pode digitalizá-la, mas isso é apenas um produto secundário, derivado do produto original.

Recentemente o ator e diretor Ralph Fiennes (“Conclave”) foi convidado a dirigiu a ópera “Eugene Onieguin”, de Tchaikovsky, prevista para estrear em janeiro em Paris. Trazer esses “alienígenas” é uma experiência a ser repetida?

Acho muito importante que não fiquemos fechados em nosso próprio público, porque fazemos parte de um ecossistema maior de artes e cultura — e a ópera, entre todas as formas de arte, sempre se alimentou de influências muito diversas. Sempre dou boas-vindas a novos elementos, porque há duas coisas aí: os novos elementos nos obrigam a nos fazer perguntas — às vezes perguntas desconfortáveis — como: por que fazemos as coisas de determinada maneira? E não pensamos nisso porque estamos acostumados. Essas novas presenças trazem algo que pode revitalizar o que fazemos. Acho importante lembrar que, mesmo em tempos difíceis — e considerando o custo de produzir ópera — há sempre a tentação de jogar com segurança. Mas, se jogarmos com segurança demais, isso é a morte da arte. Então, acredito que o elemento de risco é essencial. Precisamos manter viva essa capacidade de falhar e de, às vezes, acertar.

Mas, num mundo em que os conceitos de sucesso e fracasso se submetem ao gosto das guerras culturais e da política polarizada que vivemos, como manter essa margem para experimentar os riscos?

As coisas estão mudando o tempo todo — e isso não é necessariamente algo ruim. Também precisamos continuar mudando, porque se não o fizermos, deixamos de evoluir. E, se não evoluímos, deixamos de estar no centro da sociedade. Trata-se também de fazer as perguntas desconfortáveis, fazer as coisas de maneira diferente — mas, ao mesmo tempo, ter confiança naquilo que fazemos bem, naquilo que fazemos de um modo que outros não fazem, e entender como podemos contribuir. Acho que há algumas questões que são realmente importantes. Nesses tempos em que se questiona tanto como financiar a cultura, é fundamental manter a clareza de que nós não somos entretenimento. Claro que algo pode ser divertido, mas não é entretenimento. O papel da arte na sociedade é funcionar como um laboratório sobre como as pessoas interagem e convivem. A tragédia grega, por sua vez, foi inventada para que as pessoas das cidades da Grécia antiga pudessem se reunir e viver uma experiência coletiva que também era individual, observando algo desconfortável — mas com a permissão de que “é apenas uma peça”. Essa é a mensagem subliminar: “é só uma peça, não é sobre você”. Mas, claro, é totalmente sobre você. Só que, por ser arte, por estar num palco, você pode olhar para aquilo de um modo que jamais se permitiria olhar na vida real. Acho que isso é essencial. E tenho pensado muito sobre isso: o direito básico de qualquer espectador é gostar ou não gostar. Primeiro, há essa resposta emocional — gostar ou não gostar — e ninguém está certo ou errado. É apenas o modo como você reage à obra. Você pode ser a única pessoa na plateia que gosta… e ainda assim não está errado. E o passo seguinte, a partir daí, é se conseguimos organizar um diálogo entre quem gostou e quem não gostou. Se essas pessoas aprendem a dialogar sobre arte, esse diálogo se torna uma habilidade transferível — algo que elas podem aplicar na vida real.

Nesta próxima semana, “Yerma”, ópera de um dos principais compositores brasileiros, Heitor Villa-Lobos, será finalmente encenada num palco da União Europeia, em Tenerife. Que caminho uma ópera brasileira deve seguir para ser vista na Bastille?

Sabe, é engraçado — eu tenho uma história com “Yerma”. Antes de me mudar para Paris, fui diretor artístico da Santa Fe Opera, nos EUA, e já tínhamos começado a conversar sobre uma produção dessa ópera, que acho que finalmente vai acontecer em alguns anos.

A estreia dessa ópera foi lá (em 1971), então a ideia era trazê-la de volta — e acho que isso é ótimo. Está entre os projetos que ficam girando na minha cabeça quando penso no que ainda devemos fazer. E, claro, também por causa da conexão entre Villa-Lobos e Paris, que é maravilhosa. Falamos sobre os estilos da música contemporânea e o ponto de convergência de tudo isso é a Paris de Nadia Boulanger em que houve um momento, na história da música do século XX, em que praticamente todo mundo a conheceu ou estudou com ela, como no caso de George Gershwin.

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