A bioeconomia está em alta e prestes a ganhar a primeira política pública voltada ao setor em nível nacional. O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) finaliza o Plano Nacional de Desenvolvimento da Bioeconomia (PNDBio), após consultas públicas realizadas nos últimos meses, a tempo de apresentá-lo na COP30.
O plano, que será o instrumento operacional da Estratégia Nacional de Bioeconomia (criada pelo decreto 12.044/2024), deve envolver as seguintes prioridades: sociobioeconomia e negócios comunitários; valorização de serviços ambientais; saúde e bem-estar; química de renováveis; alimentação, bioenergia e fibras têxteis; e produção de biomassa com foco na diversificação de matérias-primas e insumos industriais.
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A discussão sobre os segmentos econômicos que vão compor o plano envolveu uma comissão criada em 2024, formada por 17 ministérios e 17 organizações da sociedade civil, representando comunidades tradicionais, povos indígenas, empresas e universidades. O debate importa porque as definições de bioeconomia estão longe do consenso: cada país que formulou suas políticas públicas dedicadas ao tema adota uma abordagem.
Em geral, nações industrializadas têm um viés mais biotecnológico, com a incorporação de tecnologias intensivas em ciência nos processos de produção. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne as economias mais desenvolvidas do mundo, e a União Europeia têm na bioeconomia uma ferramenta de mitigação das emissões de gases de efeito estufa e de promoção da transição energética.
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Caminho semelhante foi adotado pelos EUA, cuja política de bioeconomia datada de 2012 se volta para atividades econômicas impulsionadas pelas inovações nas ciências biológicas, como novos medicamentos, variedades agrícolas de alta produtividade, e o desenvolvimento de biocombustíveis e química verde.
No Brasil, a definição de bioeconomia adotada pelo governo federal e os estados engloba esses segmentos, mas passa necessariamente pelo uso sustentável da biodiversidade dos diferentes biomas do país. Busca calibrar diferentes tipos de conhecimento associados ao seu uso — o tradicional, detido pelas comunidades tradicionais que utilizam os recursos naturais — e o científico, desenvolvido pelos centros de pesquisas e universidades.
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— A bioeconomia no Brasil não é um setor em si, são muitos. Estamos falando de uma premissa de desenvolvimento que engloba tanto produção quanto serviços, com grau maior de sustentabilidade e valorização da floresta em pé — diz Carina Pimenta, secretária nacional de Bioeconomia do MMA.
O Brasil pautou a discussão internacional sobre bioeconomia no âmbito do G20 em 2024, quando esteve à frente da presidência do grupo das maiores economias do mundo. Na reunião dos chefes de Estado, no Rio de Janeiro, os países-membros concordaram em aderir aos Princípios de Alto Nível da Bioeconomia, um conjunto de dez diretrizes que reconhece o tema como estratégico para o desenvolvimento sustentável, o combate à pobreza e à desigualdade social e a mitigação da crise climática. Os dez princípios são voluntários e devem nortear ações de cooperação internacional sobre o tema, além de reconhecer que a visão de bioeconomia adotada por cada país deve respeitar a vocação e as prioridades regionais.
A África do Sul, que sucedeu o Brasil à frente do G20, neste ano, decidiu dar seguimento à iniciativa de bioeconomia do grupo e acenou que, dentro do tema, vai priorizar os objetivos de combate à pobreza e pró-equidade, além da convergência com a mitigação das emissões de gases de efeito estufa. Para a secretária Carina Pimenta, as discussões sobre bioeconomia na COP30 devem caminhar para uma convergência de visões:
— Só veremos a bioeconomia se tornar pujante globalmente se houver estratégias de aplicação conjunta e acesso a financiamento. Florestas e biodiversidade seguem subfinanciadas globalmente.
Um diferencial da bioeconomia no Brasil é o fato de o país deter grandes áreas de floresta e já possuir um arcabouço legal para regular o uso sustentável da biodiversidade, o acesso ao patrimônio genético, ao conhecimento tradicional e a repartição dos benefícios. Também conta com legislação recente para combater a biopirataria e incentivos à pesquisa da biodiversidade dos biomas brasileiros, observa Juliana Simões, líder de Sociobioeconomia da ONG TNC Brasil.
A bioeconomia já provoca um impacto significativo no Produto Interno Bruto (PIB) do país. Lançado em 2023, o estudo “Nova Economia da Amazônia”, que envolveu 76 pesquisadores e foi coordenado pelo WRI Brasil, apontou que as atividades ligadas a produtos da sociobioeconomia e ligadas a conhecimentos locais geram hoje um PIB anual superior a R$ 12 bilhões por ano para a região.
O estudo se aprofundou em cadeias como as de açaí, castanha, pescados e borracha e revelou que elas têm grande capacidade de absorver mão de obra, mas ainda de forma informal e precária. A formalização desses negócios — e das relações de trabalho — pode gerar avanços sociais significativos. Com investimentos direcionados, o setor poderia acrescentar ao PIB ao menos R$ 38,6 bilhões até 2050 e gerar entre 600 mil e 800 mil empregos até 2050.